1. Ferreira Gullar, um dos grandes poetas brasileiros da atualidade, é autor de “Bicho urbano”, poema sobre a sua relação com as pequenas e grandes cidades.
Bicho
urbano
Se disser que prefiro
morar em Pirapemas
ou em outra qualquer
pequena cidade do país
estou mentindo
ainda que lá se possa
de manhã
lavar o rosto no
orvalho
e o pão preserve
aquele branco
sabor de alvorada.
.....................................................................
A natureza me assusta.
Com seus matos
sombrios suas águas
suas aves que são
como aparições
me assusta quase
tanto quanto
esse abismo
de gases e de
estrelas
aberto sob minha
cabeça.
(GULLAR, Ferreira. Toda
poesia. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1991)
Embora não opte por
viver numa pequena cidade, o poeta reconhece elementos de valor no cotidiano
das pequenas comunidades. Para expressar a relação do homem com alguns desses
elementos, ele recorre à sinestesia, construção de linguagem em que se mesclam
impressões sensoriais diversas. Assinale a opção em que se observa esse
recurso.
(A) "e o pão
preserve aquele branco / sabor de alvorada."
(B) "ainda que lá se possa de manhã
/ lavar o rosto no orvalho"
(C) "A natureza me assusta. / Com
seus matos sombrios suas águas"
(D) "suas aves que são como
aparições / me assusta quase tanto quanto"
(E) "me assusta
quase tanto quanto / esse abismo / de gases e de estrelas"
Nessa historinha, o efeito humorístico origina-se de uma situação criada pela fala da Rosinha no primeiro quadrinho, que é:
(A) Faz uma pose bonita!
(B) Quer tirar um retrato?
(C) Sua barriga está aparecendo!
(D) Olha o passarinho!
(E) Cuidado com o flash!
Comentário: (D)A fala omitida no quadrinho é a famosa expressão “olha o passarinho”,
que os fotógrafos pedem ao fotografado, para obter um bom enquadramento da
fotografia. O humor ocorre quando Chico, dando outra conotação à palavra
“passarinho” – designação popular para a genitália masculina –, dirige seu
olhar para dentro de suas calças (para o seu ‘passarinho’), provocando
irritação em Rosinha. Pela fala do último quadrinho, percebe-se que Chico ficou
sem entender o pedido da menina.
18 ―Precisa-se
nacionais sem nacionalismo, (...) movidos pelo presente mas estalando naquele
cio racial que só as tradições maduram! (...). Precisa-se gentes com bastante
meiguice no sentimento, bastante força na peitaria, bastante paciência no
entusiasmo e sobretudo, oh! sobretudo bastante vergonha na cara! (...) Enfim:
precisa-se brasileiros! Assim está escrito no anúncio vistoso de cores
desesperadas pintado sobre o corpo do nosso Brasil, camaradas.”
(Jornal A Noite, São Paulo,
18/12/1925 apud LOPES, Telê Porto Ancona. Mário de Andrade: ramais e
caminhos. São Paulo: Duas Cidades, 1972).
No trecho acima, Mário de Andrade dá
forma a um dos itens do ideário modernista, que é o de firmar a feição de uma
língua mais autêntica, “brasileira”, ao expressar-se numa variante de linguagem
popular identificada pela (o):
(A) escolha de palavras como cio,
peitaria, vergonha.
(B) emprego da pontuação.
(C) repetição do adjetivo bastante.
(D) concordância empregada em Assim está
escrito.
(E) escolha de
construção do tipo precisa-se gentes.
Comentário:
(E) Em “Precisa-se nacionais”, “Precisa-se brasileiros” e “Precisa-se gentes”, Mário
de Andrade infringe a gramática tradicional, pois se o poeta intencionou usar o
verbo “precisar” como VTD (verbo transitivo direto) na voz passiva com sujeitos
apassivados, tal verbo deveria estar no plural, concordando com os sujeitos. O
verbo “precisar” como VTI (verbo transitivo indireto) acompanha-se da
preposição “de” e, junto com o “se”, caracteriza indeterminação do sujeito.
Nesse caso, ele se mantém sempre na 3ª pessoa do singular.
20 “Poética”, de Manuel Bandeira, é quase um manifesto do movimento
modernista brasileiro de 1922. No poema, o autor elabora críticas e propostas
que representam o pensamento estético predominante na época.
Poética
Estou farto do
lirismo comedido
Do lirismo bem
comportado
Do lirismo
funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e
[manifestações de
apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do
lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o
[cunho vernáculo de
um vocábulo
Abaixo os puristas
..........................................................................................
Quero antes o lirismo
dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e
pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns
de Shakespeare
— Não quero mais
saber do lirismo que não é libertação.
(BANDEIRA, Manuel. Poesia Completa e Prosa.
Rio
de Janeiro. Aguilar, 1974)
Com base na leitura do poema, podemos
afirmar corretamente que o poeta:
(A) critica o lirismo louco do movimento modernista.
(B) critica todo e qualquer lirismo na literatura.
(C) propõe o retorno ao lirismo do movimento clássico.
(D) propõe o retorno ao lirismo do movimento romântico.
(E) propõe a criação de
um novo lirismo.
Comentário: (E)
Manuel Bandeira, um dos pioneiros do Modernismo, está combatendo neste poema a
forma tradicional dos parnasianos, ou seja, ele objetiva criar novas
possibilidades e estimula a ruptura com os valores do passado. Assim, ele
propõe uma poesia livre das convenções estéticas e linguísticas até então
vigentes no Brasil.
O autor do texto abaixo critica, ainda
que em linguagem metafórica, a sociedade contemporânea em relação aos seus
hábitos alimentares.
―Vocês que têm mais
de 15 anos, se lembram quando a gente comprava leite em garrafa, na leiteria da
esquina? (...) Mas vocês não se lembram de nada, pô! Vai ver nem sabem o que é
vaca. Nem o que é leite. Estou falando isso porque agora mesmo peguei um pacote
de leite – leite em pacote, imagina, Tereza! – na porta dos fundos e estava
escrito que é pasterizado, ou pasteurizado, sei lá, tem vitamina, é garantido
pela embromatologia, foi enriquecido e o escambau.
Será que isso é mesmo
leite? No dicionário diz que leite é outra coisa: ‗Líquido branco, contendo
água, proteína, açúcar e sais minerais‘. Um alimento pra ninguém botar defeito.
O ser humano o usa há mais de 5.000 anos. É o único alimento só alimento. A
carne serve pro animal andar, a fruta serve pra fazer outra fruta, o ovo serve
pra fazer outra galinha (...) O leite é só leite. Ou toma ou bota fora.
Esse aqui examinando
bem, é só pra botar fora. Tem chumbo, tem benzina, tem mais água do que leite,
tem serragem, sou capaz de jurar que nem vaca tem por trás desse negócio.
Depois o pessoal
ainda acha estranho que os meninos não gostem de leite. Mas, como não gostam?
Não gostam como? Nunca tomaram! Múúúúúúú!
(FERNANDES,
Millôr. O Estado de S. Paulo, 22 de agosto de 1999)
32 A crítica do autor é dirigida:
(A) ao desconhecimento, pelas novas
gerações, da importância do gado leiteiro para a economia nacional.
(B) à diminuição da produção de leite
após o desenvolvimento de tecnologias que têm substituído os produtos naturais
por produtos artificiais.
(C) à artificialização
abusiva de alimentos tradicionais, com perda de critério para julgar sua
qualidade e sabor.
(D) à permanência de hábitos alimentares
a partir da revolução agrícola e da domesticação de animais iniciada há 5.000
anos.
(E) à importância
dada ao pacote de leite para a conservação de um produto perecível e que
necessita de aperfeiçoamento tecnológico.
Comentário:
(C) O caso do leite (pasteurizado, enriquecido, etc.) serve de exemplo para a
crítica à artificialização abusiva dos alimentos tradicionais.
33 A palavra embromatologia usada pelo autor é:
(A) um termo científico que significa
estudo dos bromatos.
(B) uma composição do
termo de gíria “embromação” (enganação) com bromatologia, que é o estudo dos
alimentos.
(C) uma junção do termo de gíria
“embromação” (enganação) com lactologia, que é o estudo das embalagens para
leite.
(D) um neologismo da química orgânica
que significa a técnica de retirar bromatos dos laticínios.
(E) uma corruptela de
termo da agropecuária que significa a ordenha mecânica.
Comentário: (B)
O autor, intencionando um efeito cômico, faz uma “montagem” brincando com as
palavras “embromação” e “lactologia”, resultando no trocadilho
“embromatologia”.
46 Em muitos jornais, encontramos charges, quadrinhos, ilustrações,
inspirados nos fatos noticiados. Veja um exemplo:
Jornal do Commércio, 22/8/93
O texto que se refere a uma situação semelhante à que inspirou a charge é:
(A) Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela
– Foi poeta – sonhou – e amou na vida.
(AZEVEDO,
Álvares de. Poesias escolhidas. Rio de Janeiro/Brasília: José
Aguilar/INL,1971)
(B) Essa cova em que estás
Com palmos medida,
é a conta menor
que tiraste em vida.
É de bom tamanho,
Nem largo nem fundo,
É a parte que te cabe
deste latifúndio.
(MELO NETO, João Cabral de. Morte e
Vida Severina e outros poemas em voz alta. Rio de Janeiro: Sabiá, 1967)
(C) Medir é a medida
mede
A terra, medo do homem, a lavra;
lavra
duro campo, muito cerco, vária várzea.
(CHAMIE,
Mário. Sábado na hora da escutas. São Paulo: Summums, 1978)
(D) Vou contar para vocês
um caso que sucedeu
na Paraíba do Norte
com um homem que se chamava
Pedro João Boa-Morte,
lavrador de Chapadinha:
talvez tenha morte boa
porque vida ele não tinha.
(E) Trago-te flores, – restos arrancados
Da terra que nos viu passar
E ora mortos nos deixa e separados.
(ASSIS,
Machado de. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 1986)
Comentário: (B)
Esta questão exige reflexão. Notemos que o título da imagem “Demarcação de
terras indígenas” está ligado ironicamente à figura de covas comuns/anônimas.
Assim, surge uma indagação: será que as covas são as terras dos índios?
Ironicamente, a alternativa B poderia ser até uma legenda para essa imagem, se
pensarmos nos conflitos constantes que ocorrem entre índios e brancos pela
ocupação de terras, uma vez que os direitos originais dos primeiros são
usurpados ou por latifundiários ou pelo Estado; não resta, para o índio, nada
além da sua simples cova. É a parte que lhe cabe no latifúndio.
57
O
uso do pronome átono no início das frases é destacado por um poeta e por um
gramático nos textos abaixo.
Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do
aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o
bom branco
da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
“Iniciar a frase com
pronome átono só é lícito na conversação familiar, despreocupada, ou na língua
escrita quando se deseja reproduzir a fala dos personagens (...).”
(CEGALLA, Domingos
Paschoal. Novíssima gramática da língua portuguesa. São Paulo: Nacional,
1980)
Comparando a explicação dada pelos
autores sobre essa regra, pode-se afirmar que ambos:
(A) condenam essa regra gramatical.
(B) acreditam que apenas os esclarecidos sabem essa regra.
(C) criticam a presença de regras na gramática.
(D) afirmam que não há regras para uso de pronomes.
(E) relativizam essa
regra gramatical.
Comentário:
(E) Questão que requer conhecimento das regras de colocação pronominal. Em ambos os
casos, as situações são específicas: ambiente escolar (professor e aluno) e
linguagem oral (dos camaradas) no poema de Oswald de Andrade, e linguagem
escrita (norma culta) não voltada para a oralidade no texto de Cegalla.
59 As histórias em quadrinhos, por vezes, utilizam animais como
personagens e a eles atribuem comportamento humano. O gato Garfield é exemplo
desse fato.
O 3º quadrinho sugere que Garfield:
(A) desconhece tudo sobre arte, por isso
faz a sugestão.
(B) acredita que todo pintor deve fazer
algo diferente.
(C) defende que para ser pintor a pessoa
tem de sofrer.
(D) conhece a história
de um pintor famoso e faz uso da ironia.
(E) acredita que seu dono tenha
tendência artística e, por isso, faz a sugestão.
Comentário:
(D)No quadrinho, Garfield sugere que seu dono comece seu trabalho imitando Van
Gogh, um famoso pintor que, em um ato de loucura, cortou a orelha e fez dois
autorretratos demonstrando seu desesperado ato de automutilação.
Fonte: http://www.joseferreira.com.br/blogs/lingua-portuguesa/enem/questoes-de-lingua-portuguesa-no-enem-2000-gabarito-comentado/
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